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O SOFRIMENTO DE MASHIACH (III)

Discutimos nas duas mensagens anteriores passagens bíblicas talmúdicas e místicas que testificam que, de acordo com a tradição judaica, parte do processo de revelação de Mashiach inclui um período de intenso sofrimento e de séria doença para ele, Mashiach. Duas razões básicas foram apresentadas pelos estudiosos. Na mensagem anterior, consideramos a primeira, segundo a qual como líder, Mashiach está intimamente ligado às ações de seu povo, por elas sendo responsável e por elas sendo afetado.

A segunda razão para a doença de Mashiach diz respeito a ele próprio, como uma pessoa que se torna rei e Redentor do povo judeu e, depois disso, de toda a humanidade. O processo de se tornar Mashiach representa uma transformação da pessoa. Para Mashiach avançar para o estágio seguinte é preciso que ele, num certo sentido, deixe de ser quem ele era. Assim como se dá na mudança de condição de qualquer pessoa — seja uma alteração das circunstâncias externas ou o trauma interno dos estágios da vida — a metamorfose de Mashiach de ser simplesmente um homem sábio e santo, para o verdadeiro rei e Redentor envolve como que uma sublevação um desequilíbrio.

Por esta razão, referimo-nos com freqüência ao tempo da vinda de Mashiach como “as dores do parto de Mashiach”, pois assim como o trabalho de parto de uma gestante envolve uma luta tremenda e difícil, assim, também a emergência de Mashiach pode exigir uma dolorosa ruptura das condições anteriores, levando a confusão, agitação e desordem. Naturalmente essa convulsão afetará tanto a geração como o próprio Mashiach.

Rabi Schneur Zalman, conhecido como o Alter Rebe, fundador do chassidismo Chabad, explica, num discurso breve e brilhante, porque haverá uma sublevação antes de Mashiach ser plenamente revelado, e como será a sua doença. O povo judeu é considerado uma entidade, um corpo — uma pessoa completa. Cada judeu, todo judeu, diz ele, tem uma função sem igual, um serviço Divino próprio só àquela pessoa, seja ele de natureza intelectual, emocional ou física. Sem toda e cada uma das pessoas, o povo judeu não poderia ser um todo. O que afeta a uma pessoa, a todas afeta.

No entanto, naturalmente, o que acontece à cabeça tem repercussões que vão mais longe, e as conseqüências — D’us não o permita — de um ferimento seja onde for, são, digamos assim, medidas na cabeça. Por analogia, o que acontece à pessoa que é a cabeça, o líder da geração, acontecerá à própria geração. E o que acontece à geração acontecerá ao líder. Isto é, o líder da geração, mas particularmente Mashiach, é o reflexo microcósmico da situação macrocósmica e da experiência da geração.

Agora: quando uma alma ocupa um corpo ela “habita”, digamos assim, no cérebro, e de lá guia os membros de uma maneira ordenada. Existe paz entre cada uma das partes. Cada órgão desempenha sua função, respondendo às orientações da alma. Mas quando — D’us não o permita — há um problema no cérebro, quando o sangue não pode circular adequadamente, isto se espalha por todos os demais membros e suas funções e situações tornam-se confusas. Quando a cabeça é assim afligida, os membros do corpo não podem reagir adequadamente. Há um entorpecimento, uma incapacidade da mente e do corpo para se comunicarem; na verdade, ainda que a mente esteja ativa, ainda que cada órgão considerado individualmente — coração, fígado, etc. — possa estar saudável e funcionando, mesmo assim parece que a pessoa está em coma, aparentemente desligada e desconectada do mundo externo.

Esta condição de aparente paralisia interna ou confusão e inconsciência externa encontra paralelo no estado do povo judeu no tempo da grande escuridão e indiferença. Isto é, assim como a mais profunda escuridão da noite acontece pouco antes do surgimento da aurora, assim também a confusão entre o povo judeu — a incapacidade de aceitar o serviço Divino, ainda que desempenhado de acordo com a Lei Judaica, a mistura entre o bem e o mal, são mais fortes pouco antes de Mashiach.

Pois, ressalta o Alter Rebe, existe às vezes necessidade do caos e da estupefação, por mais dolorosos e difíceis que sejam para a pessoa suportá-los, ou — para o povo judeu — experimentá-los. Às vezes, quando a luz Divina, a alma Divina, precisa brilhar, para ser revelada, de uma forma e maneira categoricamente novas, então, assim como a noite como se torna mais espessa antes de vir a luz, ou o labor é mais intenso antes do parto — assim como toda a atenção e todo o esforço se concentram na profunda luta transformacional — assim também, dentro da pessoa haverá grande confusão e dissensão interna. A transição — a grande diferença — entre a velha e a nova condição espiritual pode exigir uma traumática sublevação interna, e uma conseqüente exclusão e isolamento do mundo exterior.

Mas, depois da escuridão, virá a luz. Depois das dores de parto, há vida nova. E depois da doença transformacional, haverá Mashiach, o Rei e Redentor, que harmonizará, transformará e elevará espiritualmente sua geração, aquele que terá o conhecimento do Senhor assim como as águas cobrem o oceano.